Imagem: Índias Zoe – Gênesis – Sebastião Salgado
Poroca, Piracema, Pirapora e Itaoca. Assim,
nesta ordem e sem imagens, as palavras de origem tupi, apareceram escritas
naquele sonho em preto e branco, “times new roman”, alternando seus tamanhos
maiores ou menores, às vezes em negrito outras não. A mim cabia a necessidade
premente de encontrar-lhes o significado em seu nascedouro. Certo que não os
encontrei enquanto dormia, tarefa adiada para depois do café da manhã e dos jornais
do dia.
Poro’roka é o gerúndio do verbo
“estrondar” e é usado para definir o encontro ruidoso das águas de alguns rios.
Saída de peixes é o significado de piracema, nome dado ao período em que os
peixes sobem os rios até suas nascentes para desovar. Pirapora é o salto dos
peixes, em plena piracema, para vencerem as corredeiras dos rios, enquanto
Itaoca é simplesmente uma casa de pedras, onde no litoral capixaba ficavam
protegidos os pequenos barcos pesqueiros que habitavam as águas nos anos setenta
e oitenta.
Os sonhos e seus significados guardam
interpretações populares as mais diversas e foram, como sabido, objeto de
estudos de Freud, que por fim refutou a própria teoria sobre eles. Ando lendo
muitas lendas e mitos indígenas ultimamente, o que faz com que o sonho com
símbolos léxicos se enquadre na categoria de restos diurnos, formados por
vivências ou experiências passadas no período de vigília.
Interessante foi que durante a pesquisa
dos termos em tupi, veio-me a imagem nítida: uma fotografia de Sebastião
Salgado, em Gênesis, retratando as índias Zoe. Foi através dela, que tomei
conhecimento da ainda existente tribo com cultura poligâmica e poliândrica
preservada em meio à luxuriante floresta ao norte do Pará. Lá cada mulher
possui quatro ou cinco maridos, em convivência harmoniosa, o que talvez e
somente talvez se associe ao significado de tanta água corrente e peixes
saltitantes no sonho que não parecia ter pé ou cabeça. Que não haja
psicanalistas de plantão!
Publicada no Jornal “O Pioneiro” em 20/04/2014