As minhas lágrimas regam os sentimentos mais puros e verdadeiros e me fazem renascer a cada nova estação. (Mônica Caetano Gonçalves Maio/2011)
Registro na Biblioteca Nacional nº: 570.118

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Apartamento 03

Imagem: Foto do Pouso Chico Rei - Ouro Preto


Sedento mira a quartinha
Pousada entre ângulos e quinas,
Guardando o frescor da fonte
Que no horizonte se derrama.

27/11/2012




domingo, 25 de novembro de 2012

Raízes


Wassily Kandinsky – Houses in Murnau on Obermarkt, 1908 



“Bom dia! Desculpe incomodar”... Assim, educada, a pedinte que me aborda no semáforo e mais do que isso, desperta minha consciência e o olhar que tantas vezes segue desatento, ocupado com as atribulações do dia.
Logo adiante, o prédio de estrutura metálica vermelha, contrasta com a mulher que espera para atravessar a avenida: pequena e de orelhas grandes, aparentes sob o cabelo, mais parece um duende cabisbaixo que perdeu o encantamento da mata. E o parque em meio a tantos tons de cinza, é memória verde de outros tempos. Tempos de coreto, roda gigante, bicicleta e ar mais puro. Imagens concretas da cidade que me acolheu menina, onde criei raízes, plantei família e amigos e colhi o pão.
Hoje, uma cidade grande, com todos os contrastes que são inerentes às cidades brasileiras, mas ainda uma grande cidade. O crescimento desordenado, a despreocupação quanto aos impactos ambientais, um somatório da falta de planejamento urbano, resultam agora na busca de soluções que humanizem a metrópole e tornem a sua existência e a de quem nela vive, mais palatável.
São tantos os rostos anônimos, com suas histórias ímpares, à espera de oportunidades desiguais e igualados no transporte coletivo ineficiente. Muitos são vítimas comuns do descaso e das inundações e acidentes que ocorrem na época das chuvas, apresentadas pela mídia que explora as alterações climáticas causadas pelo homem e sua economia de cifras poluentes, muitas vezes esquecendo-se dos bueiros entupidos. E passados o impacto das imagens e as chuvas, todo esse sofrimento transforma-se em números estatísticos.
Como muitos, falo de raízes, agora de uma forma diferente. É que uma árvore não se mantém frondosa se suas raízes não forem bem alimentadas e cuidadas, apesar de não serem aparentes. É, por aqui, é preciso arregaçar as mangas e cuidar do que é básico, de nossas encostas, rios e raízes antes de se sentar elegantemente a discutir o protocolo de Kyoto.

Publicada no Jornal "O Pioneiro" em 25/11/2012

domingo, 18 de novembro de 2012

Coincidências


Wassily Kandinsky – Composition VIII - 1923



Chamo simplesmente de coincidências, o que muitos classificam através de inferências e interpretações até esotéricas e assim vão muito além, ao mundo das fantasiosas e elucubrativas associações humanas.
Aconteceu assim com Kandinsky, artista que desde cedo me impressionou - de forma, eu diria, empírica - em especial em sua fase musical, com suas composições e improvisações. Do sentir suas cores e formas, nasceu o interesse em conhecer mais sobre o homem, seu mundo e suas influências. Já na primeira e sucinta leitura biográfica, a constatação: a coincidência em nossas datas de nascimento.
Mais tarde o descobri na poesia, muito menos conhecido pelas letras do que reconhecido pelas tintas. A propósito, trago aqui os versos desse poeta intitulado “Mais tarde”:
Na profunda altura eu hei de encontrar-te./ Lá onde o liso fura./ Lá onde o afiado não corta./ Tu usas o anel na mão esquerda./ Eu uso o anel na mão direita./ Ninguém vê a corrente./ Mas estes anéis são os últimos elos da corrente.//O começo// O fim. (Tradução: Anabela Mendes).
De um poeta a outro, Rilke, que tanto aprecio, além do fato de também ter nascido em um 4 de dezembro, fala de seu entendimento sobre as artes, em uma das cartas a um jovem poeta. Nela, Rainer diz que arte é apenas um modo de viver e é possível se preparar para ela sem o saber, vivenciando-a de uma maneira ou outra. E acrescenta que em tudo que é real há maior proximidade do que é artístico do que nas falas dos profissionais, que ao simular o conhecimento, negam e atacam, na prática, a existência da arte. Tece ainda críticas aos jornalistas, críticos e até literatos, nesse aspecto e é dessa forma que explica, bem melhor do que eu, que o essencial quando se trata de arte é a percepção, o experimentar e sentir.
Não por mera coincidência, é indispensável o equilíbrio entre razão e emoção!

Publicada no Jornal "O Pioneiro" em 18/11/2012


sábado, 17 de novembro de 2012

Flor de laranjeira






Quero o canto do sabiá
colorindo o amanhecer
de um dia de primavera.
Perfume de laranjeira,
sem voos solitários
ou asas molhadas
de João de barro.


17/11/2012


domingo, 11 de novembro de 2012

Uma jovem senhora chamada Lisa

Mona Lisa – Leonardo da Vinci



Triste, irônico ou enigmático? A verdade é que, mais do que a identidade da jovem senhora, mona em italiano, o sorriso de Lisa se transformou em uma verdadeira charada. São inúmeras as teorias sobre ele. É certo que se tornou o retrato mais visto no mundo, pela apurada técnica de pintura utilizada por Da Vinci, mas a curiosidade humana e aquele sorriso levaram-nos além.
Da Vinci habitualmente registrava tudo: pensamentos, rabiscos, simpatias e antipatias (muitas, diga-se de passagem), fórmulas matemáticas, inventos e até sua contabilidade doméstica. Curiosamente, nada escreveu sobre essa anônima dona de casa.
A maioria dos historiadores concorda tratar-se de Lisa Gherardini, nascida em um dia abafado do verão de 1479, casando-se aos quinze anos com um influente comerciante de Florença, Francesco di Bartolomeo di Zanoli de Giocondo (daí La Gioconda), com quem teve cinco filhos, além de um enteado. Há porém quem duvide dessa identidade e afirme, como a especialista em arte Maike Vogt-Lüerssen, tratar-se de Isabel de Aragão, duquesa de Milão ou ainda que a bela pintura seja um autorretrato, Da Vinci em versão feminina.
Mas o foco aqui, caro leitor, é o sorriso de Lisa. A pobre poderia simplesmente estar entediada e cansada de posar, já que Da Vinci, comprovadamente refez a pintura várias vezes ao longo de quatro anos. E se Isabel ao invés de Lisa, o sorriso tristes e justificaria pelo alcoolismo e agressões do Duque, além de uma provável homossexualidade. Há ainda a argumentação de alguns odontólogos, que afirmam ser o sorriso contido uma forma de ocultar os dentes cariados ou tortos e até as falhas dentárias, pela inexistência de tratamento à época.
De minha parte ouso lembrar que a interpretação do gestual e das expressões fisionômicas, perpassa pelas referências e inferências de quem observa, sendo inclusive influenciado por seu estado emocional e desejos. Assim, o sorriso ou não-sorriso de Mona Lisa jamais será uma unanimidade. Decifre-o!




Pubicado no Jornal "O Pioneiro" em 11/11/2012

Pela janela

Imagem: Fotografia de acervo pessoal

Tímida é a luz
e clareia o branco
que envolve
as adormecidas montanhas
que pressinto.

11/11/2012

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Nostalgia




Cheiro de terra molhada.
Uma vontade verde
de banco de praça,
um cansaço concreto
de cimento armado.
Nostalgia de conversa fiada,
de cadeira na calçada,
de mim e meu interior.

08/11/2012

terça-feira, 6 de novembro de 2012

domingo, 4 de novembro de 2012

Reminiscências

Fotografia de Eduardo Gonçalves e Veiga

O tempo fez uma curva e entre a fumaça e a bruma da manhã, redesenharam-se em minhas lembranças, histórias minhas, dentro da História. Tempo das ‘Mais belas Histórias’ e primeiras letras, que o destro gesso, fruto de peraltices, deixou que brincassem de ser ‘gauches’ e visitas às Igrejas, que pela frequência, tornaram-me tão eloquente quanto os jovens e descalços guias de então.
“Seu” Juquinha se apresentava em seu terno de elegância impecável e reverente chapéu de feltro marrom. Deliciava a todos com seus casos, pausadamente contados e entrecortados pelos goles fumegantes do café da tarde e os biscoitos de polvilho fresquinhos que nos trazia. Não fosse pela mineiridade dos sabores, seria um ritual britânico, tal a pontualidade e gentileza dos gestos e palavras.
Diferente era a alegria de uma que seria Maria, mas era Lourdes, simplesmente. Chegava com suas largas e balouçantes ancas, protegida do sol pela trouxa equilibrada sobre a cabeça. Vinha envolta no sonho ancestral das gentes daquelas vertentes com provas materiais da riqueza derramada. O menor frasco da botica guardava nas pequenas pepitas, o sustento para as tantas bocas que a esperavam em casa, seus unguentos, as roupas de chita e para as meninas, até um laço de fita.
Dos becos sombrios, surgia o homem negro, de negro vestido, que as noites sem lua abrigavam. Era quase um espectro, que com olhos trêmulos e revirados, num sorriso de cera, apresentava as aranhas e serpentes aninhadas sob o roto chapéu de abas largas e novamente desaparecia entre gargalhadas fantasmagóricas, depois de colher lágrimas apavoradas no olhar incrédulo das crianças.
Embalada pelo movimento cadenciado, pelo som monocórdio do trem sobre os trilhos, dormente, revi pessoas, hoje personagens, guardados em outros tempos, bailando entre as alegorias das festas pagãs e a constrição das cerimônias religiosas que as seguiam em quarentena, até que o apito centenário lembrou que a vida seguiu por outros caminhos, estradas reais.

Publicada no Jornal "O Pioneiro" em 04/11/2012


sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Luzes na ribalta


Imagem: Ruinas dos banhos romanos, Trier, Alemanha – Foto de Jones Antônio dos Santos
 (Jones Poa).

               
Tenho lido muitos excertos de textos e trabalhos acadêmicos do filósofo Michel Onfray, fragmentados entre publicações de jornais e revistas. Tão fragmentados quanto meu conhecimento sobre a obra desse filósofo francês, nascido de um pai, trabalhador rural e uma mãe, governanta, em meados do século passado, passado tão próximo como o de muitos de nós. O fato é que Onfray tem sido apresentado como um demolidor do pensamento humano constituído, como fosse um crítico ferrenho a historiadores, filósofos e teóricos, passando por Nietzsche, Rousseau e Freud, entre outros.
Esse é o meu incômodo! A parcialidade não ilumina suficiente e adequadamente o conhecimento. Explico: A veiculação parcial das ideias de Onfray, ou de qualquer outro, induz ao leitor mediano e alheio ao meio acadêmico a conclusões precipitadas, seja desacreditando nas contribuições do estudioso ou pior, concluindo que os caminhos trilhados pelas ciências até então, são todos equivocados.
Vale lembrar que todas as teses e teorias que foram descontruídas ao longo dos séculos, serviram como alicerce para as edificações posteriores e que a necessidade de destruição, alimenta o desejo ancestral de dominação e poder do homem sobre o homem. Não há como apagar, ainda que na história da Ciência, personagens como Einstein e Freud, debatendo através de cartas, sobre as guerras e os destinos da humanidade. Inimaginável? Mas aconteceu sim, em 1932, com a genialidade dos mestres perpassando por argumentações embasadas em contextualizações históricas, antropológicas; pelo desenvolvimento das espécies, pelas influências religiosas, do direito e dos mitos e instintos, encontrados em Eros e Tanatus.
Em todos os tempos, pensadores, dominantes e dominados, preservacionistas e pacifistas - ainda que por razões de sobrevivência individual – buscaram e buscam formas para se atingir e instaurar a ‘Paz na terra aos homens de boa vontade’ e até para os de má vontade, por que não? Há que se pensar sempre, até que se estabeleça, sejamos nós grandes ou pequenos pensadores.


(Sigmund Freud – Obras Completas Volume 18 Tradução: Paulo César de Souza - Companhia das Letras -  Porque a Guerra – Carta a Einstein -1932)

Publicada na Revista eletrônica Capita Global News em 02/11/2012