As minhas lágrimas regam os sentimentos mais puros e verdadeiros e me fazem renascer a cada nova estação. (Mônica Caetano Gonçalves Maio/2011)
Registro na Biblioteca Nacional nº: 570.118

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Decrescendo

Imagem: Crianças brincando – Cândido Portinari


Durante uma gestação normal estamos, todos nós, confinados ao pequeno espaço do ventre, que para nós nesta fase é todo o universo na mais perfeita harmonia, até que, sem nenhuma explicação, somos expulsos de lá. É o que chamam os estudiosos de nosso primeiro trauma.

Com alguma sorte, somos prontamente acolhidos no colo e no seio, que também é lar, simbioticamente nossos, e nos permitem ser. Uma imensidão a explorar à nossa disposição, até descobrirmos o outro, quase sempre um irmão que já estava lá ou chega depois. Verdade! Já não somos os absolutos donos do pedaço e dividir o espaço é inevitável. Mas, num passe de mágica, este outro é também nosso companheiro de todas as aventuras que ousamos. Somos astronautas, a desbravar galáxias inventadas, super-heróis com poderes inimagináveis, princesas encantadas ou fadas etéreas.

Então surge uma grande e imbatível ameaça: Não, você não pode... E atrás do não, o certo e o errado e todos os limites. A porta fechada, para além da qual não se pode ir sozinho porque há perigos rondando lá fora. É aí que a realidade começa a roubar a cena.

Na escola, para onde vamos cada vez mais cedo, percebemos que somos muitos com os mesmos sonhos e fantasias e com isto nos fortalecemos. Vem o quando eu crescer... Bombeiros, médicos, músicos, bailarinas começam a se desenhar de forma idealizada na vida adulta, motivo de diversão para os adultos próximos.

E assim seguimos aprendendo os cubos - muitas vezes empilhados - que nos dão abrigo, os quadros translúcidos - permitindo almejar a utopia dos horizontes que não alcançamos -, o outro lado da rua; os limites da cidade, as fronteiras dos países desenhados no mapa-mundi. Chegamos finalmente à adolescência e contestamos tudo, esperando expandir o pouco espaço que nos cabe. Sonhamos ser gente grande, na ilusão da liberdade de sermos, sem saber que a gente encolhe quando cresce.


Publicada no Jornal “O Pioneiro” em 02/02/2014

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