Imagem: Ferrovia Madeira Mamoré, foto Dana Merril
Onde ficaram as águas de março fechando o
verão? Este ano somente na lembrança de Jobim. Não vieram para estas bandas e
não por encanto evaporaram-se. Passamos do nulo ao baixíssimo e posteriormente
ao baixo risco de desabastecimento de água e concomitante aumento dos custos de
energia, até que amarelamos de vez. O raciocínio é óbvio – todo líquido que se
aquece evapora -, mas não cabem na lógica predatória dos incendiários senhores
que alardeiam sua produção e lucros a qualquer preço desde o início da era
industrial.
Pode parecer paradoxal, mas enquanto
lamentamos as torneiras minguando e o deserto surgido onde antes abundava vida
na Represa de Furnas, as águas esparramaram-se pelo Rio Madeira abaixo,
afogando de vez os trilhos de nossas memórias. O pouco que restava da Estada de
Ferro Madeira-Mamoré construída no início do século XX, as velhas locomotivas,
o museu e suas peças históricas foram literalmente água abaixo.
Ainda piores, são as perdas humanas, os
milhares de sobreviventes desabrigados, estradas intransitáveis e centenas de
cabeças de gado afogadas. Afinal quem leva em conta as análises de impacto
ambiental? Quem se lembra de como é formada a bacia do Madeira? Não, não previram
que os rios Beni e Madre de Dios receberam uma sobrecarga d’água, com o maior
degelo dos Andes somado às fortes chuvas em suas cabeceiras.
Enquanto sobra lá nas esquecidas terras –
ou águas - de Rondônia, a nossa fonte de vida, e da qual viemos, escasseia
abaixo da linha do Equador, já que mesmo com toda a nossa riqueza hídrica nos
esquecemos de sua finitude e a exploramos sem a menor consciência e
consideração pelo bem coletivo.
Dizem os estudiosos do clima que as altas
temperaturas neste verão foram atípicas, enquanto modestamente indago se não se
trata de um aumento progressivo observado a cada ano. Resta-me perguntar como
Drummond: “Quem reconhece o drama, quando se precipita (ou não), sem máscara”?
Publicada no Jornal “O Pioneiro” em 06/04/2014
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