As minhas lágrimas regam os sentimentos mais puros e verdadeiros e me fazem renascer a cada nova estação. (Mônica Caetano Gonçalves Maio/2011)
Registro na Biblioteca Nacional nº: 570.118

domingo, 29 de setembro de 2013

No dial

Imagem: The starry night – Vincent Van Gogh


Vindo do trabalho para casa, naquele horário de trânsito caótico e espremida entre carros e buzinas, de relance a vi nascente, cheia, esplendidamente exuberante e imensa. Logo adiante, compulsoriamente parada, lunática como sempre, me ouvi dizendo a ela entre risos:

- O que é isso Lua? Que exagero!

No rádio, a primavera antecipada de Tim Maia homenageava a lua de setembro. Inevitavelmente pensei, em meio a tantos acorrentados em seus minúsculos mundos, que certamente poucos a viram linda, em seu maior espetáculo. Enamorada, não me importava mais com o tempo que nos é roubado dos dias pela confusa e atribulada vida em uma grande cidade.

A semana seguiu corriqueira até o domingo, quando me dei conta de que oficialmente entrávamos em uma nova estação, primavera aqui e outono lá. Os ipês já haviam colorido a cidade com todas as suas cores e as flores enfeitavam jardins e praças, já que a natureza soberana não se pauta pelas datas no calendário ou convenções por nós inventadas. O sol logo pela manhã se fez verão, quente e abafado, até que a brisa da tarde trouxesse uma chuva fina e rápida o bastante para exalar o perfume da terra molhada e deixar que me perdesse de mim, novamente admirando a lua pela janela do quarto, ela em seu quarto minguante.

Pelo dial da memória, passavam melodias e mais melodias, cheias de luas e primaveras coloridas, dando-me a dimensão da importância para todos nós dos marcos do tempo e da natureza. Mais do que simplesmente medi-los, os ciclos - sejam dias ou estações - se refletem através de seus fins e começos em nossa vida afetiva. São universais as associações de sentimentos às estações: a alegria e as paixões relacionadas ao verão, contrapondo-se ao recolhimento muitas vezes melancólico no inverno, a reflexão sobre as pernas no outono e a esperança de renascer na primavera. Monets, Van Goghs e Vivaldis!


Publicada no Jornal “O Pioneiro” em 29/09/2013

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