Imagem: Bordadeiras, em Santana - Madeira
Trago
em mim as longas tardes de cambraias, linhos e fios bordados e tecidos na
varanda; de uma tradição de milênios, uma verdadeira colcha de retalhos
pequenos e coloridos das tantas influências culturais que aqui desembarcaram.
Uma entre as ricas expressões culturais, com uma característica especial: a de
ser essencialmente feminina.
Há
um mosaico composto ponto a ponto, na delicadeza plena de todas as linhas e
tons que compõem a história das mulheres nas sociedades humanas de todos os
tempos. Vou ao encontro das tantas Helenas, retratadas por Chico Buarque,
tecendo longos e pacientes bordados à espera de seus heróis de Atenas,
manifestando seus sentimentos de amor, saudades e solidão. De lá, viajo no
espaço e no tempo para a ilha da Madeira de cinco séculos atrás, antes que o
bordado se tornasse produto exportado para a Europa por sua grande beleza e
qualidade e chego finalmente ao Brasil de meados do século XIX, época em que
viveram minhas bisavós, das quais herdei as habilidades com as agulhas,
bastidores e um ovo de cerzir meias que guardo carinhosamente.
A
história do bordado acompanha, há muito e muito tempo, a trajetória das
mulheres, trazendo as suas marcas em diferentes espaços, alinhavadas pelo modo
feminino de ser, fazer e viver, perpassando pela submissão e exploração
feminina, o cuidado dedicado à família e a criação da sustentabilidade, muito
antes da palavra ou da era industrial que tornariam o conceito indispensável.
Caminhando um pouco mais vimos as habilidades manuais se tornarem renda, como
parte do processo de inserção da mulher no mercado de trabalho.
Hoje,
quando as vejo por toda parte nas feiras de artesanato que sobrevivem pelo
Brasil afora, sinto a força feminina nos caminhos de nosso gênero impressa por
mãos incansáveis em seus trabalhos. Há uma parte da mulher que somos em cada
pedacinho colorido, no bordado, nas rendas, crochês e tricôs. Na História,
somos somente retalhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário