Imagem: Goethe Gallerie –
Wilhelm Von Haubath -1890
Sem que
inicialmente me ocorresse o motivo, lembrei-me de um desses casos, repetidas vezes
contados que toda família tem. Uma entre tantas histórias de meu bisavô Martim,
alemão católico que escolheu o Brasil como pátria de seus filhos.
Na casa de
cozinha grande e fogão de lenha, a avó, mãe e tias preparavam o almoço animadas
pela conversa, sem se descuidarem do menino, com seus três anos de idade, que
brincava por lá. Todas o advertiam quando se aproximava do fogão, encantado
pelo brilho e cor das chamas, novidades em seu mundo de magia infantil.
Calmamente
sentado à mesa, lendo seu jornal, Vô Martim chama o pequeno e leva-o até o
fogão, aproximando a mãozinha arteira do fogo para que sentisse o calor e
explicando que poderia se queimar.
Depois disso,
antes de voltar à sua leitura, chama a avó:
- Jovelina, traz a pomada e que
nenhuma de vocês fale mais nada com ele - sentenciou.
Naturalmente,
não tardou e o pequeno Robson queimou os dedinhos nas brasas, chorando
desconsolado como toda criança depois das travessuras desastradas.
- Fem cá no Fofô! - disse
Martim, com seu sotaque carregado.
- Fofô não disse que faz totói?
– completou enquanto socorria o pequeno com o unguento que aliviava as dores.
A lição também é
para os mais protetores, nem sempre réus confessos como eu. À teimosia infantil
e onipotência adolescente, ambas surdas, é a experiência dolorida que ensina.
Cabe-nos, com nossas próprias cicatrizes, acalentar-lhes o choro sentido até
que entendam que os erros na vida não são como rabiscos que se apagam com
borracha; que são suas marcas que firmam nosso passo e orientam o caminho.
Histórias como
esta se tornam encantadas em nossas memórias, quase lendas, plenas de saudades.
Parafraseando Clarice Lispector, sempre oportuna: Um dia meu anjo da guarda,
vestido de pai, disse-me que teria que fazer tudo por mim mesma e foi embora.
Publicada no
Jornal “O Pioneiro” em 20/10/2013
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