Imagem: “L’hommequiplantaitdesarbres – Fréderic Back
Foi sem consentimento expresso, sem
que a busca estivesse à flor da consciência que planejei o voo que me levaria a
outra serra, de montanhas outras. Pousei suavemente numa manhã muito azul e
mais quente do que as primaveras deveriam permitir, que logo se tornou tarde de
encontros e boa prosa sob as sombras das árvores, fartas em nossa caminhada.
A casa e seus viventes receberam-me
como se estivesse de volta depois de uma longa viagem. Pelas janelas,
descortinava-se o vale de verde imenso riscado pelo rio que serpenteava até
onde a vista alcançava, perdendo-se entre as curvas de montanhas sobrepostas
além e por elas filtrava-se a luz morna que trazia um mundo de fora para
dentro, inundado de perfumes e cantos silvestres.
Havia um encantamento único, vindos
das mãos calejadas e suaves do homem que plantava árvores e cultivava amigos.
Singular em sua obra, fez da leveza de suas mãos que conduzem a pena através de
suas tantas histórias, a força que semeia o chão ávido de sombras generosas.
Foi inevitável associá-lo à história fantástica, mas real, da vida de Elzéard Bouffier
contada pelo romancista francês Jean Giono, que certamente encontraria em sua
biblioteca - que pousada sobre um mezanino - parecia flutuar sob o telhado
rústico, uma entre suas peripécias criativas que me proporcionou bons momentos
com Ezra Pound, entre seus milhares de livros.
Conduziu-me gentilmente, creio que
intuitivamente, a encontrar-me sem que me procurasse, ao ensinar-me a acordar as sementes. Trouxe comigo como lembrança, o
perfume das andirobas e buritis e a renovada certeza que entre tantos ineptos e
insossos, há os raros que muito fazem em seu pouco, marcando silente e
indelevelmente seus caminhos pelo mundo, não com pedrinhas a serem seguidas,
mas semeando a esperança dos frutos a serem colhidos adiante. Tão raros que não
alardeiam feitos em busca de honrarias vãs, são simplesmente, inteiros, plenos
de vida como sementes.
Publicada na Revista Capita News em
22/11/2013
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