As minhas lágrimas regam os sentimentos mais puros e verdadeiros e me fazem renascer a cada nova estação. (Mônica Caetano Gonçalves Maio/2011)
Registro na Biblioteca Nacional nº: 570.118

sexta-feira, 29 de março de 2013

A vizinha do lado



Imagem: "There's more to consumers then numbers” - The Financial Express.

Falávamos sobre arte, não a convencional, mas a difícil arte de conviver com os vizinhos. Eram casos hilários, alguns tragicômicos, que cada um de nós contava, entre gargalhadas. Foram várias histórias captadas através das quase transparentes paredes de apartamentos; algumas recheadas com a figura do síndico, quase sempre um chato profissional, que não lembra só a música, mas é a própria personificação de Tim Maia; além daquela vizinha de cadeiras oscilantes, que Doryval Caymmi cantou e todo mundo jura que tem uma também.

 Bons momentos de distração, na tarde que insistia em não terminar e que me trouxeram lembranças da menina que fui, nas cidades de interior em que vivi, já que até os sete anos de idade já tinha passado por quatro cidades mineiras - por contingências profissionais de meu pai –, antes de criar raízes na capital. Nelas os vizinhos eram mais que amigos, quase parentes por proximidade. Havia uma troca de amabilidades, receitas e bordados entre as famílias, além da oferta dos quitutes - recém saídos do forno e anunciados pelo perfume -, que seriam retribuídos depois, já que seria imperdoável, devolver o vasilhame vazio.   
   
Logo percebi como era diferente viver numa cidade grande: tudo era mais distante e as pessoas também. Apesar de muitas vezes viverem empilhadas umas sobre as outras, o relacionamento nem sempre passa de um lacônico Bom dia, sem identidade; quando não descamba para reclamações sobre os incômodos alheios, tão bem retratados num certo Recado ao Senhor 903 de Rubem Braga ou por Marina Colasanti: A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
         Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

Publicada na revista CAPITA Global News em 29/03/2013          

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