As minhas lágrimas regam os sentimentos mais puros e verdadeiros e me fazem renascer a cada nova estação. (Mônica Caetano Gonçalves Maio/2011)
Registro na Biblioteca Nacional nº: 570.118

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Vida de pescador


Ilustração: Pescador – Tarsila do Amaral


Em meu pequeno mundo de fantasias, meu pai, além do herói de todos os dias, nas horas vagas era como um personagem de filme; um misto de Tarzan e Daniel Boone. Era comum passar vários dias no rancho, nos barrancos do São Francisco e voltar com poucos peixes e muita história para contar.
Havia um longo cerimonial que antecedia as viagens, tempo em que eu me via entre anzóis e chumbadas, molinetes e tarrafas. Natural que eu levasse na bagagem para os dias adolescentes, um pouco desse espírito aventureiro e de lá trouxesse umas poucas histórias para contar.
O ambiente era perfeito: a praia de Itaoca (ES) em fins dos anos 70 era uma típica colônia de pescadores, com seus costumes, solícitos e hospitaleiros como toda a boa gente brasileira.
Manhã de azuis de Van Gogh e perfume de Jorge Amado na brisa mansa à beira-mar; um chapéu e um punhado de iscas, horas esquecidas ao som cadenciado das ondas na arrebentação. Calmaria interrompida pelo ranger da vara de pescar envergando e pelo som que ouvia vibrando em minhas mãos. O que era? Não fazia ideia!
Teria que trazer aquilo, fosse o que fosse, antes que a linha arrebentasse. E foi uma briga feia, viu? Um garoto bonito, do alto dos seus dez anos de sol e mar, disse ser um animal, com um nome que me soou meio tupi, meio guarani. Inacreditável e de classificação taxonômica tão misteriosa quanto o monstro de Ness! A cabeça de tartaruga, que não solta o anzol de jeito nenhum, corpo de cobra, arrematado por um ferrão como o das arraias, que diziam venenoso.
Assim que finalmente tirei aquele ser da água, enrolado linha acima, alguém cortou fora a cabeça e enquanto o corpo se enterrava na areia de ré, corri para casa, pensando que o melhor seria ter ido a Piúma, colher inofensivas ostras na Ilha do Meio.

* Dia do Nascimento do Homem que me ensinou a pescar.

Em "O Pioneiro" 23/09/2012


Um comentário: